Bloco da Saudade: patrimônio cultural da Vitória de Santo Antão
“Saudade não se mata, alimenta-se” (Zito Mariano)
por Lissandro Nascimento
O Bloco mais esperado da segunda-feira de carnaval arrastou uma multidão em um verdadeiro “Baile no Asfalto” que nesta edição completou 24 anos, permitindo um belo cortejo ao som da Orquestra Super Oara, sob a animação de Elaque Amaral, dando um empolgante show sob o Trio Elétrico Asas da América. A Saudade fez uma homenagem à passagem pelos 390 anos do povoamento da Vitória de Santo Antão, na Zona da Mata, quando foi fundada em 1626 pelo português Diogo de Braga.
A agremiação, que tem o mesmo nome do tradicional bloco recifense, propõe o retorno aos antigos carnavais com orquestra tocando frevos e marchinhas. Reunindo várias gerações numa verdadeira multidão, gente de todas as idades pára para acompanhar ou só olhar das varandas. O Bloco da Saudade reúne modernidade e tradição no circuito dos trios elétricos do carnaval de Vitória. Sob o comando do versátil Cristiano Pilako, o Bloco tomou as ruas do corredor da folia vitoriense sob a agitação de saudosos foliões que curtem o legítimo frevo pernambucano. Comprometido e apaixonado pelas raízes históricas e culturais da Vitória de Santo Antão, Pilako traz para o presente o sabor de antigos carnavais e adiciona-lhes uma dose de modernidade.
A Saudade se destaca também pela organização impecável, a pontualidade, o repertório identificado com as raízes do nosso carnaval, somado ainda ao fato de distribuir bebidas aos integrantes do Bloco, quando inovou em 2016 na distribuição da bebida dispensando a equipe de garçons que servia aos associados durante o percurso. Em troca, o folião da Saudade ganhou duplamente a quantidade de Teachers, na versão PETACA (popularmente conhecida por PETECA ou PETEQUINHA).

Confira todas as imagens do Bloco no site Coberturafest.com.br. Fotos: Geisimar GPL / A Voz da Vitória / Cobertura Fest
Idealizado pelo saudoso vitoriense Zito Mariano, a Saudade de Vitória foi inspirada ao fato de que em 1962, imbuído com um espírito nostálgico dos carnavais da primeira metade do século XX, o compositor Edgard Moraes compôs a marcha ‘Valores do Passado’, homenageando 24 blocos pernambucanos já extintos. Na letra da canção, o autor idealizava o “Bloco da Saudade”, uma agremiação que tomaria as ruas do Recife revivendo aqueles inesquecíveis grupos carnavalescos, representantes de uma manifestação cultural do Carnaval Pernambucano que estava desaparecendo e sendo esquecida. Eis que, em 1973, onze anos depois de Edgard Moraes ter composto a canção, um grupo de amantes do Carnaval, encabeçado por Antônio José Madureira “Zoca” e Marcelo Varela, apostou com o compositor que criaria o Bloco da Saudade e que com ele reviveria os antigos carnavais cuja tradição encontrava-se praticamente perdida. O hino seria exatamente o frevo ‘Valores do Passado’. Madureira e Varela cumpriram sua promessa e colocaram, no Carnaval de 1974, o Bloco da Saudade pela primeira vez na rua, desfilando pelo bairro do Cordeiro.
Basta constatar que ao lado do Galo da Madrugada, os blocos líricos são tradição no Carnaval pernambucano. Mais antigos, surgiram nos anos 1920, enquanto o Galo nasceu no final da década de 1970. Na mesma linha, aqui temos o Clube de Fado Misto Taboquinhas que completou 92 anos. Para reconhecê-los, basta prestar atenção aos antigos frevos e marchinhas executados, sobretudo pelas ruas de Recife e Olinda.
Assim, a inspiração que estimulou o Bloco da Saudade em Vitória o atesta como patrimônio cultural, elemento fundamental para a memória e a identidade de um povo. A agremiação carnavalesca detém os elementos que se referem à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos identificados na folia de Momo, sendo uma herança cultural transmitida de geração em geração. Em cada passo do corredor da folia vitoriense se fez notar uma legião de apaixonados por antigos frevos, desde adolescentes às pessoas de terceira idade, permitindo-se atestar que o bloco já se consolidou como patrimônio cultural da Terra das Tabocas.